Por Antônio de las Cuevas, advogado especialista em Direito aplicado ao Agronegócio
Provavelmente você tenha se deparado com notícias sobre a escassez de insumos para a indústria brasileira, que vem impactando diversos setores da economia, até mesmo o potente agronegócio. Neste artigo iremos abordar os efeitos jurídicos da não entrega dos insumos agrícolas contratados e quais cuidados o produtor rural precisa ter caso haja o descumprimento do contrato.
Com a pandemia da COVID-19 e a crise energética de escala global, muitas indústrias da base fecharam. De acordo com uma pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV Ibre), dentre os vários segmentos prejudicados pela falta de insumos, 70% estão concentrados nas indústrias automobilísticas, informática e eletrônicos e químicos.
Em se tratando do Agronegócio, a crise energética que assola a China e tem limitado a produção naquele país, está impactando o Brasil, visto que o país asiático é um dos maiores fornecedores de insumos para fabricação de defensivos agrícolas.
Apesar do alerta feito no final do ano passado por especialistas do mercado sobre o disparo no custo dos insumos agrícolas (e até mesmo a sua falta) para as safras que viriam, na largada para o plantio 2021/2022 a “profecia” se concretizou.
Por exemplo, o glifosato, que já está em falta e quando é encontrado, pode apresentar-se até 2366% mais caro que em 2020 (Fonte: USP).
Além disso, de acordo com a Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja Brasil), produtores relataram atrasos ou cancelamentos das entregas dos insumos para o plantio atual, o que preocupa a todos.
Sabe-se que as empresas fornecedoras de defensivos e fertilizantes prezam pelo cumprimento das entregas e que a sua atividade, assim como a do produtor rural, também sofre devido às intempéries e a variação cambial. Porém, a situação que estamos enfrentando hoje é idêntica à da safra verão 2020/2021, em que se discutiu a rescisão ou revisão dos contratos (a termo) de venda de safra futura, cuja a variação dos preços das comodities fez com que o valor travado no fechamento dos contratos duplicasse no período da entrega dos produtos.
E mesmo assim, a ampla maioria dos produtores, apesar de toda a discussão que pairava sobre a aplicação da teoria da imprevisibilidade ou da onerosidade excessiva nos contratos a termo, de forma coerente, cientes dos prejuízos que trariam para a cadeia agroindustrial em eventual descumprimento, cumpriram com a obrigação. Devendo o mesmo raciocínio ser aplicado às empresas fornecedores de insumos.
Entre o produtor e os demais agentes da cadeia produtiva existe um elo muito forte em que um depende do outro para sobreviver. Diante deste cenário, em que o produtor comprou antecipadamente o insumo mas corre o risco de não o receber, o primeiro passo é estabelecer um diálogo com o parceiro, objetivando traçar estratégias para mitigar eventuais prejuízos.
Havendo a comprovação de que o produto não será entregue, é confirmada a rescisão unilateral do contrato. A partir daí, caberá ao produtor buscar novos fornecedores para garantir a sua safra, devendo toda decisão ser documentada e registrada para futuro ressarcimento dos prejuízos sofridos.
Se a empresa não tiver os insumos, não há como obrigá-los a entregar. Havendo prejuízos em decorrência do descumprimento do contrato, cabe ao produtor iniciar o diálogo com a empresa para buscar o ressarcimento dos danos sofridos. Caso, não seja possível a resolução de maneira administrativa, alternativa não resta, se não buscar o judiciário para compensação dos danos sofridos, desde o recebimento da diferença paga a mais pela aquisição de novos insumos, até mesmo o que se deixou de ganhar pela safra frustrada.
Sobre a responsabilidade dos prejuízos sofridos pelo produtor, o artigo 389 do Código Civil Brasileiro que trata do inadimplemento das obrigações em geral, prevê que uma vez “não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado”.
Como bem dito pelo colega advogado agrarista Francisco Torma, o qual compartilho do mesmo entendimento, estamos diante de uma “evidente situação de responsabilidade civil do fornecedor de insumos que, ao não efetivar a entrega dos insumos previamente negociados, inviabiliza a cultura do produtor rural ou – no mínimo – diminui substancialmente sua produtividade. Entretanto, para que reste configurada a responsabilidade do fornecedor, é importante que o produtor tome alguns cuidados e adote algumas medidas.” O produtor, ao perceber que lhe faltará insumo adquirido mediante contrato, através de sua equipe (agrônomo, advogados, contador e demais membros do staff) deverá produzir provas técnicas que lhe respaldem em uma possível ação judicial para reparação dos danos.
Por fim, a empresa fornecedora dos insumos, deverá prezar pelo cumprimento da obrigação, entregando o produto ou amenizando os prejuízos que foram causados ao produtor. Lembrando que o mesmo raciocínio empregado ao produtor que não entrega os grãos, seja por alteração cambial ou intempéries, aplica-se também neste caso.
Artigo publicado pela Revista do Sindicato Rural de Rio Verde / GO - Edição novembro/2021
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