Por Aibes em 10/03/2023
Medidas executivas atípicas: Limites para aplicação da decisão do STF que determinou a suspensão da CNH e passaporte de devedores

Por: Stella Amaral Freitas, advogada, com atuação voltada ao Direito Civil, Empresarial, Agronegócio e Imobiliário

Em vigor deste março de 2015, o atual Código de Processo Civil (CPC), expandiu no campo de exploração da resolução de demandas, o poder do judiciário em aplicar novas medidas executivas atípicas para suplementar àquelas que já eram empregadas no Código anterior, e têm como objetivo principal retirar algo que o devedor possui livre fruição, fazendo com que o mesmo seja estimulado a dar cumprimento ao que está sendo executado, respeitando os limites constitucionais.

Por não especificar no CPC quais medidas poderiam ser aplicadas, o legislador deixou aberto a possibilidade do credor de requerer qualquer medida atípica que possibilite a resolução da lide, cabendo ao Juiz decidir se a medida é aplicável ou não ao caso concreto.

Para estabelecer um limite na aplicabilidade de tais medidas, devem ser sempre seguidos os princípios básicos trazidos na Constituição Federal (CF) de 1988, não podendo as medidas executivas atípicas ferir quaisquer dos direitos básicos constitucionais do devedor.

A atipicidade dos meios executórios trouxe a possibilidade de o magistrado criar paradigmas legais que colaborem para a satisfação da obrigação imposta ao devedor. Neste sentido, o Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que as medidas executórias atípicas são medidas necessárias e que devem ser adequadas, proporcionais e razoáveis, buscando assim assegurar o cumprimento da ordem judicial.

Em regra, essas medidas atípicas serão adotadas após exauridos os meios típicos (penhora de dinheiro e bens móveis e imóveis que são utilizados para garantir a obrigação) já habitualmente utilizados para induzir o devedor ao cumprimento da obrigação a ele imposta.

Dessa forma, esgotados os meios típicos de recebimento, poderão ser adotadas as medidas atípicas, considerando ser comum a ocultação fraudulenta do patrimônio pelo devedor, impedindo o credor de encontra-los em meios usuais do judiciário para sustentar a obrigação que lhe é devida. Neste caso, as medidas executivas atípicas são utilizadas como último meio para assegurar que o devedor cumpra as condutas primordiais de boa-fé e cooperação perante o juízo e assim pague o seu débito.

Com a implantação do artigo 139, inciso IV, do CPC, foi iniciada a discussão sobre a constitucionalidade da aplicação da medida que determina a suspensão da CNH – Carteira Nacional de Habilitação e do passaporte de devedores.

Após anos de debate nas cortes, o Supremo Tribunal Federal, através do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n.º 5.941, reconheceu a constitucionalidade na utilização de tais medidas atípicas em face dos devedores, desde que sejam observados os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, primando sempre pelo ato menos gravoso ao executado, conforme ditames do CPC.

Segundo o Ministro Luiz Fux, a adequação da medida deverá ser analisada caso a caso e qualquer tipo de abuso encontrado em sua aplicação poderá ser coibido mediante recurso apresentado pela parte prejudicada, provando o executado/parte que a medida aplicada fere os seus direitos constitucionais.

Assim, tem-se que para aplicar corretamente as medidas executivas atípicas, caberá ao Juiz analisar com cautela o caso concreto, devendo certificar se foram infrutíferas outras tentativas constrição tipicamente utilizadas para o cumprimento da obrigação, sendo que, somente após tal constatação, serão utilizadas as medidas atípicas, que, devendo ser aplicadas em situações extraordinárias, desde que devidamente justificadas.

Assim, ainda que julgamento da ADI tenha pacificado o entendimento e trouxe mais segurança jurídica para a medida cabível, há limites para a sua aplicação, devendo ser observado princípios básicos constitucionais. A título de exemplo, quando o devedor é um motorista de aplicativo e tem a sua CNH apreendida, não poderá exercer a sua profissão, manter o seu sustento e muito menos honrar com o seu débito, tratasse de uma medida ineficaz para o credor e devedor, dificultando a sua subsistência.  

O julgamento desta matéria foi importante para afastar qualquer argumento de inconstitucionalidade da medida considerada atípica. No entanto, até que seja aplicada, muito será analisado para que seja utilizada no processo executório.

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