Por Aibes em 22/01/2024
Corregedor geral de Justiça e o cancelamento de matrícula e registro de imóvel rural, uma afronta ao direito de propriedade

Por Antônio de las Cuevas, advogado especialista em Direito Aplicado ao Agronegócio.

Não restam dúvidas de que o agronegócio brasileiro vem sofrendo com as decisões tomadas pelos três poderes que administram o Brasil (Executivo, Legislativo e Judiciário). No executivo, temos políticas públicas que na verdade desmotivam o seguimento, no Legislativo, tanto no âmbito Municipal quanto estadual, uma sanha arrecadatória nas receitas do setor, e não diferente, no Judiciário, decisões que violam diretamente o direito de propriedade do produtor rural ou empresas, trazendo uma insegurança jurídica sem precedentes, como é o caso da decisão que iremos discutir.

Por questão de espaço, não iremos aprofundar na discussão jurídica complexa que envolve o tema, mas informar como funciona este ato administrativo previsto na Lei 6.739/79 (Dispõe sobre a matrícula e o registro de imóveis rurais) e atualizar os produtores rurais desta decisão.

Criada durante a gestação do Presidente João Figueiredo (1979), anterior a promulgação da Constituição Federal de 1988 (05.10.1988), reconhecida como uma Constituição que protege a ampla defesa, respeito ao devido processo legal, à inviolabilidade da propriedade privada e do direito à moradia, princípios que reforçam a tão falada segurança jurídica, a legislação em discussão estabeleceu procedimentos administrativos autoritários de retificação e cancelamento da matrícula de imóveis rurais em prol dos entes públicos.

Antônio, como funciona esse processo de cancelamento da matrícula e registro pelo Corregedor Geral de Justiça?

Uma vez verificada que terras públicas foram objeto de apropriação indevida por quaisquer meios, inclusive decisões judiciais, a requerimento do ente público, sem a ciência do proprietário do imóvel/atingido, tolhendo-lhe o exercício de qualquer meio de defesa nesta fase administrativa, será declarado o cancelamento da matrícula imobiliária que não estiver de acordo com os requisitos da Lei 6.015/73 (Lei sobre os registros públicos) e nº 6.216/75 (altera a Lei de registros públicos).

Após o cancelamento, no prazo de 05 dias, o proprietário será notificado pessoalmente apenas para tomar ciência da decisão e cumprimento do ato administrativo. Somente após a decisão final, o atingido poderá ingressar com a ação anulatória e lá exercer o seu direito de defesa. Pasmem, o prosseguimento do ato administrativo não para com o ajuizamento da ação, podendo a União, o Estado, ou Município promover administrativamente perante o registro de imóveis, a retificação da matrícula, do registro ou da averbação.

Com base na violação de tantos direitos fundamentais considerados invioláveis (cláusula pétrea), a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil – CNA, ajuizou neste ano, a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) de nº 1056, com o objetivo de discutir a constitucionalidade dos artigos da Lei nº 6.739/1979, que garante ao Corregedor-Geral da Justiça, a requerimento de pessoa jurídica de direito público (União, Estado, Municípios e autarquias), declarar a inexistência e cancelar a matrícula e o registro de imóvel rural.

A ação teve como relator o Ministro Alexandre de Moraes, o qual solicitou parecer do Congresso Nacional e Presidente da República, manifestando estes contrários a tese firmada pela CNA. Submetido para votação em sessão no plenário virtual do STF entre os dias 17.11.2023 a 24.11.2023, por unanimidade dos Ministros, não foi acolhido o pedido da CNA.

De acordo com o acórdão proferido pelo Ministro, acompanhado por todos os outros Ministros da corte, “...quando se está diante do exame dos registros imobiliários que repercutam no patrimônio público, essa referida presunção relativa pode ser ainda reforçada pela própria origem da titularidade das terras no Brasil. Todas as terras foram originalmente públicas.” Cabendo tão somente o judiciário a fiscalização, caso uma ação anulatória seja ajuizada pelo prejudicado.

Com as devidas ressalvas por não mencionar trechos importantes do voto, por envolverem questões estritamente técnicas de direito, a decisão em discussão é mais uma amostra da cautela na aquisição de imóveis rurais.

A análise de toda cadeia dominial e como formalizou-se as operações anteriores de transferência do imóvel, se mostra mais uma vez imprescindível para que situação como essa não venha a acontecer.

Com as reiteradas decisões proferidas pelo STF (marco temporal, desapropriação de áreas produtivas e esta última), não se admite mais a aquisição de uma propriedade rural por meio de uma simples análise de uma certidão de inteiro teor, é necessário sim ter um corpo jurídico para que diligências sejam realizadas “garantindo a segurança jurídica” dessa operação. Consulte sempre um advogado de sua confiança.

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